por Isabela Gomes e Malu Lima
A reforma trabalhista (Lei nº 13.467 de 2017) representou um avanço significativo na resolução de conflitos trabalhistas de forma consensual e célere, ao introduzir a jurisdição voluntária no ordenamento jurídico. Esse tipo de jurisdição, que se caracteriza pela regulação de interesses privados sem a presença de um conflito judicial propriamente dito, permite a intervenção do Estado apenas para assegurar a validade e eficácia dos negócios jurídicos celebrados entre as partes.
Com a reforma, foram inseridos na CLT os artigos 855-B a 855-E, que regulamentam o processo de homologação judicial de acordos extrajudiciais entre empregado e empregador. Este mecanismo visa proporcionar maior segurança jurídica às partes, que, em consenso, podem resolver litígios ou prevenir futuras demandas, sempre sob a chancela do Judiciário.
O artigo 855-B estabelece os requisitos iniciais para a homologação, a saber: a necessidade de petição conjunta; a representação por advogados distintos para cada uma das partes; e a opção do trabalhador de ser assistido por advogado de sua confiança. Distribuída a ação, o juiz tem o prazo de 15 dias para analisar o acordo, podendo, a seu critério, designar audiência. Em seguida, proferirá sentença homologatória do acordo, conforme previsto no artigo 855-D.
Anteriormente, existia a possibilidade de homologação parcial, permitindo que o juiz homologasse apenas as parcelas expressamente descritas no acordo. No entanto, verbas não discriminadas poderiam ser objeto de ação judicial futura, o que gerava incerteza e imprevisibilidade para os empregadores, além de potenciais novas demandas.
A Resolução do CEJUSC nº 02/2018 do TRT5, por exemplo, seguia esse modelo de quitação parcial, conforme previsto no seu artigo 2º, que vedava a quitação total e irrestrita dos contratos de trabalho nos acordos extrajudiciais. Entretanto, esse cenário mudou com a publicação da Resolução CNJ nº 586/2024, que trouxe novas diretrizes e um impacto significativo para a segurança jurídica nas relações de trabalho.
A Resolução CNJ nº 586/2024 estabeleceu que, uma vez homologado o acordo extrajudicial, ele terá efeito de quitação ampla, geral e irrevogável. Isso implica que, após a homologação, o empregado não poderá ingressar na Justiça para pleitear outras verbas relacionadas ao contrato de trabalho encerrado, salvo algumas exceções expressas, como sequelas acidentárias ou doenças ocupacionais desconhecidas na data do acordo. Essas exceções estão listadas no parágrafo único do artigo 1º da referida resolução:
“A quitação prevista no caput não abrange: I – pretensões relacionadas a sequelas acidentárias ou doenças ocupacionais que sejam ignoradas ou que não estejam referidas especificamente no ajuste entre as partes ao tempo da celebração do negócio jurídico; II – pretensões relacionadas a fatos e/ou direitos em relação aos quais os titulares não tinham condições de conhecimento ao tempo da celebração do negócio jurídico; III – pretensões de partes não representadas ou substituídas no acordo; e IV – títulos e valores expressamente ressalvados.”
Uma das maiores inovações trazidas pela Resolução CNJ nº 586/2024 é a previsibilidade dos custos para as empresas. Com a quitação plena, o empregador tem a segurança de que o acordo homologado extingue por completo as obrigações decorrentes do contrato de trabalho. Anteriormente, a possibilidade de o trabalhador pleitear novas verbas, após um acordo parcial, gerava um risco de novas ações e, consequentemente, de custos adicionais e imprevisíveis.
Agora, ao ter a garantia de quitação total, as partes podem prever com clareza os custos envolvidos na rescisão contratual, uma vez que as verbas objeto do acordo são definitivas e não estarão sujeitas a futuras disputas judiciais.
Esse fator não apenas desonera o Judiciário, mas também cria um ambiente de maior segurança jurídica, promovendo a confiança e incentivando o uso dos métodos consensuais para a solução de conflitos. Como destacado pela Resolução, a previsão expressa de quitação geral no acordo evita litígios futuros e favorece a previsibilidade de despesas para os empregadores, além de assegurar aos trabalhadores que o acordo foi devidamente analisado e homologado.
Com isso, a resolução de conflitos trabalhistas passa a ser um processo mais eficiente e seguro, tanto para empregadores quanto para empregados, que podem contar com a certeza de que o acordo homologado encerra definitivamente todas as pendências relacionadas ao contrato. Além disso, as exceções previstas na resolução protegem os direitos fundamentais dos trabalhadores em situações excepcionais, como no caso de doenças ocupacionais desconhecidas.
Assim, desde a Reforma Trabalhista de 2017 até a Resolução CNJ nº 586/2024, é evidente que os avanços no âmbito da Justiça do Trabalho fortaleceram significativamente a resolução de conflitos de maneira consensual e célere. A implementação da homologação de acordos extrajudiciais e a previsão de quitação ampla e irrestrita não apenas contribuem para desafogar o Judiciário, mas também estabelecem um sistema mais moderno e equilibrado nas relações laborais, criando um ambiente mais justo e previsível para todos os envolvidos.